Instituto Nacional de Economia Circular – INEC

Nem tudo que brilha é ouro: reflexões sobre a reciclagem de eletrônicos

Guardar eletrônicos esperando lucro é “história para boi dormir, afinal”, o descarte correto gera muito mais valor


Por Marcelo Souza*


O saber popular é muito grandioso e presente em nosso dia a dia. E os causos e ditos – que de vez em quando têm verdades ocultas – nos alertam, geram curiosidade e até aprendizados. 


E para compor este artigo, voltado para a questão da reciclagem de eletrônicos, resolvi trazer um causo e um dito, que claro, ambos mesclam verdade e mito.


Histórias que o povo conta

Para começar, vamos com o causo. Provavelmente você já ouviu alguém dizer que “produtos eletrônicos têm ouro”, não é mesmo?

Pois é, isso é verdade, mas não aquela verdade que gostaríamos que fosse – de que se acumularmos um monte de itens eletrônicos, podemos reverter todo ouro presente nestes em riqueza.

Chega a ser engraçado, não é? Mas há quem acredite nisso. E o resultado pode ser o acúmulo compulsivo de aparelhos, acompanhado da dificuldade de realizar o descarte consciente.


Vamos falar de aspectos técnicos: REEE

Agora, um pouquinho de técnica. REEE significa Resíduos de Equipamentos Eletroeletrônicos, que consiste basicamente todo aparelho que funciona com energia elétrica e é descartado após o uso. Nesta categoria estão: 

  • celulares, tablets e computadores; 
  • TVs, monitores, rádios e DVDs; 
  • geladeiras, fogões e máquinas de lavar; 
  • brinquedos, ferramentas, cigarros eletrônicos e mais


É muito importante ressaltar que nem todo eletrônico é igual. Cada tipo possui uma composição diferente, o que afeta diretamente como ele deve ser desmontado e reciclado. Para se ter uma ideia, aqui vai alguns itens e suas devidas composições (média em peso):

  • Computadores: 30% metais / 25% plástico / 20% placas / 25% outros 
  • Geladeiras: 55% aço / 15% plástico / 10% cobre/alumínio / 20% outros 
  • Máquinas de lavar / fogões: 60% aço / 20% plástico / 10% graxa/lã de rocha 
  • TVs e aparelhos de som: 40% plástico / 30% vidro / 20% metais / 10% outros 
  • Celulares: 25% plástico / 25% placas / 25% bateria / 25% vidro 



Mas e o ouro? Tem mesmo ou é só historinha?

Bom chegou o momento de tratarmos do ouro… e é claro que vou trazer um velho dito popular.

Pois é, “nem tudo que brilha é ouro”, lembra desse? Se aplica direitinho ao que vamos tratar agora. E sim, há ouro nos produtos eletrônicos. Para ser mais preciso, ele está nas placas eletrônicas e raramente passam de 20% do peso do equipamento. Veja só: 

  • TV ou monitor: menos de 0,05 gramas 
  • Celular: de 25 a 50 mg 
  • Computador: de 0,2 a 0,5 gramas 
  • Notebook: de 0,1 a 0,3 gramas

Diante disso, para juntar de 300 a 350 gramas de ouro são necessárias cerca de 1 tonelada de placas de celular, cerca de 8 mil aparelhos.

Portanto, guardar dois ou três celulares esperando valorizar é só adiar o descarte correto.


Cada componente exige tratamento próprio

Reciclagem de eletrônicos não é igual à de papel ou plástico. Cada material precisa de um processo específico. Acompanhe:

  • Gases refrigerantes (em geladeiras) → precisam ser removidos com segurança
  • Placas eletrônicas → trituradas, separadas e tratadas quimicamente 
  • Plásticos técnicos → separados por tipo e reaproveitados como matéria-prima 
  • Baterias → recicladas sob controle rígido por risco de incêndio ou contaminação 
  • Vidros com chumbo → armazenados de forma controlada



Descartar corretamente é um ato de responsabilidade

Além de exigir conhecimento técnico, a reciclagem de eletrônicos depende de sistemas logísticos adequados e pontos de coleta confiáveis.

Ao descartar corretamente evitamos contaminação do solo e da água, contribui para a economia circular e gera empregos na cadeia de desmontagem e reaproveitamento. 

Voltando lá no começo, sobre o “produtos eletrônicos têm ouro”… sim, tecnicamente falando, essa afirmação – para muitos um causo – é verdadeira, mas socialmente prejudicial. Ela faz as pessoas acumularem resíduos em casa esperando lucro, quando na prática, reciclar é o que realmente gera valor. 



*Marcelo Souza é presidente do INEC, CEO da Indústria Fox e autor dos livros “Reciclagem de A a Z – Circularidade de recursos para um futuro sustentável” e “Economia Circular: o mundo rumo à quinta revolução industrial” 

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